Brasília – O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3239, defendida pelo Partido Democratas (DEM), foi suspenso pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira (18). A ação pede a inconstitucionalidade do Decreto nº 4.887, editado pelo governo Lula em 2003 para regulamentar o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos.
Apesar da decisão ainda estar em aberto, a sessão terminou com gosto amargo para as comunidades quilombolas e organizações defensoras dos direitos humanos. O relator da matéria e presidente do STF, Cezar Peluso, votou pela procedência da ADI 3239 e pela inconstitucionalidade do decreto. Seu voto, porém, mantém a validade dos títulos já emitidos.
Peluso adotou a argumentação base do DEM, sustentando que a prerrogativa de regulamentar o artigo 68 do Ato das Disposições Transitórias (ADCT) da Constituição de 1988 – como faz o decreto – pertence ao Legislativo e não ao Executivo. “Não pode o presidente da República baixar decreto que ofenda o princípio da reserva de lei”, disse.
O presidente do STF também repetiu a tese do DEM ao considerar inconstitucional “uma nova forma de desapropriação” supostamente estabelecida pelo decreto e o critério de autoatribuição para identificar os remanescentes dos quilombos e na caracterização das terras a serem reconhecidas a essas comunidades.
Após o voto proferido pelo relator, a ministra Rosa Weber pediu vista e foi atendida pelo plenário. O julgamento ainda não tem data para ser retomado, mas certamente acontecerá sob nova presidência. Nesta quinta-feira (19) Cezar Peluso passará o cargo para o ministro Carlos Ayres Britto.
Defesa da AGU
Contestando a argumentação do DEM de que um decreto não pode regulamentar a Constituição, o advogado geral da União, Luís Inácio Adams, disse que a medida do governo Lula foi tomada para dar cumprimento imediato ao mandamento constitucional expresso claramente no artigo 68 do ADCT. O artigo diz: “Aaos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”.
Adams também ressaltou que a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil, estabelece a autoatribuição como um critério legítimo para a definição de áreas ocupadas por povos indígenas e tribais e destacou que tal processo de reconhecimento não é feito a esmo. “238 pedidos de regularização de áreas quilombolas já foram rejeitados pela Fundação Palmares”, disse.
Além da Advocacia Geral da União (AGU), também rejeitaram a ADI 3239 em plenário do Supremo os representantes da Procuradoria Geral da República (PGR), da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), da Procuradoria do Estado do Paraná, da Confederação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e do Instituto de Advocacia Racial e Ambiental (Iara).
A defesa foi feita pelos advogados do DEM, da Sociedade Rural Brasileira e da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa), além do ministro Peluso.